Romantismo e o panorama histórico

Introdução

O romantismo, um movimento estético cultural que surgiu na Inglaterra e Alemanha no final do século XVIII, se estendeu para França, Itália e posteriormente para toda a Europa, perdurando até meados do século XIX. No Brasil e em Portugal, esse movimento se caracterizou por tematizar heróis medievais e sonhar com um mundo ideal. A poesia narrativa de Almeida Garret, Camões, marcou o início do romantismo em Portugal em 1825, enquanto que no Brasil, a obra Suspiros poéticos e saudades, de Gonçalves de Magalhães, em 1836, marcou o início desse movimento. Durante o período histórico em que o romantismo surgiu, a Europa passava pela crise pós-Revolução Francesa e o povo ansiava pelos ideais de liberdade, unido aos efeitos da Revolução Industrial, despertou no povo uma frustração pelo novo poder que surgia: a posse do dinheiro.

Romantismo

Período literário, ou seja, movimento estético cultural iniciado na Inglaterra e Alemanha, fins do século XVIII, que se estende para França, Itália e mais tarde para toda a Europa e se prolonga até meados do século XIX. Interessa-nos, neste momento, abordar o que significou esse movimento no Brasil e em Portugal e como isso ocorreu.

Panorama histórico

A Europa passava pela crise pós Revolução Francesa. O poder da monarquia se aniquilava e a burguesia se estabilizava, o capitalismo abria caminho. O povo ansiava pelo emblema "Liberdade, Igualdade, Fraternidade" gerado pelos ideais napoleônicos, naquele momento, vitoriosos. O desejo generalizado pelos ideais de liberdade, unido aos efeitos da Revolução Industrial, despertou no povo uma frustração pelo novo poder que surgia: a posse do dinheiro. Parecia ao povo que os valores morais se perdiam.
O que surge nas, então, produções literárias em Portugal? - Saudade dos heróis! Reflexões sobre o sentimento! No entanto, tanto politicamente quanto na arte os ideias românticos tendiam ao caráter inovador e subversivo.

Em Portugal, as produções escritas tematizam seus heróis medievais ou sonham com um mundo ideal. O marco aceito como o início do Romantismo em Portugal é com a poesia narrativa de Almeida Garret, Camões, em 1825.

Ergui a voz, clamei contra a vergonha
Que o nome português assim manchava,
Esconjurei as sombras indignadas
Dos heróis fundadores de um império
Que tão bastardos netos destruíram.
Em vão clamei; as minhas verdades duras
Mole ouvido os tiranos ofenderam:
Puniu desterro injusto a minha audácia.
(Camões, canto quarto, XII) {: cite=recuo.lpeu}

No Brasil, o tema procura o índio, idealizado como herói, o negro, as paisagens, a pátria etc. Lembrando que a pátria nesse momento passava por uma fase importantíssima - o Brasil sediou a capital de Portugal nessa época, o Rio de Janeiro. D. João VI veio com toda a corte para o Brasil em 1.808. A obra que marca o início desse movimento é Suspiros poéticos e saudades, de Gonçalves de Magalhães, em 1836:

Ele sonha... Alto moço se lhe antolha
De belo e santo aspecto, parecido
Com uma imagem que vira atada a um tronco,
E de setas o corpo traspassado,
Num altar desse templo, onde estivera,
E que tanto na mente lhe ficara,
— "Vem!" lhe diz ele e ambos vão pelos ares.
Mais rápidos que o raio luminoso
Vibrado pelo sol no veloz giro,
E vão pousar no alcantilado monte,
Que curvado domina a Guanabara.
(Suspiros poéticos e saudades. Gonçalves de Magalhães) {: cite=recuo.lpeu}

Conhecemos três fases importantes na poesia romântica:

  • 1ª geração: Indianista/naturalista.
    A exaltação ao índio, à natureza - o reconhecimento do Brasil como pátria:

"Em pé, no meio do espaço que formava a grande abóbada de árvores, encostado a um velho tronco decepado pelo raio, via-se um índio na flor da idade.
Uma simples túnica de algodão, a que os indígenas chamavam aimará, apertada à cintura por uma faixa de penas escarlates, caía-lhe dos ombros até ao meio da perna, e desenhava o talhe delgado e esbelto como um junco selvagem."
... (José de Alencar) {: cite=recuo.lpeu}

  • 2ª geração: Ultra-Romântica (influência de Lord Byron).
    Nesta fase, havia, entre os romântivos, uma tendência aos vícios: boemia, bebida, fumo, sexo e com uma visão de mundo voltada ao pessimismo, egocentrismo, angústia. Essa atitude ligava-se ao poeta inglês Lord Byron, daí o termo byronismo:

"Quando em meu peito rebentar-se a fibra,
Que o espírito enlaça à dor vivente,
Não derramem por mim nem uma lágrima
Em pálpebra demente." ... (Álvares de Azevedo) {: cite=recuo.lpeu}

  • 3ª geração: Condoreira/Poesia Social
    Seguidores do escritor francês Victor Hugo, tendência literária entre os românticos das últimas gerações. Esses poetas e escritores defendiam a justiça social e a liberdade. No Brasil, registram-se a luta pela república e fim da escravidão:

"Oh! bendito o que semeia
Livros... livros a mão cheia... E manda o povo pensar!
O livro caindo n'alma
É germe - que faz a palma, É chuva - que faz o mar."
... (Castro Alves) {: cite=recuo.lpeu}

O Romantismo consolida-se em nossa literatura com Primeiros Cantos (1846), de Gonçalves Dias, e O Guarani (1857), de José de Alencar (na prosa).

Brasil e Portugal

Em Portugal, a Revolução Constitucionalista do Porto, em 1820, esquentou o ideial o romântico tanto quanto, no Brasil, o processo da Independência, em 1822. O pensamento que contrapõe-se ao movimento anterior, ou seja, a arte clássica caracteriza-se por:

  • Egocentrismo
    O sentimento caracteriza-se pelo subjetivismo, o individualismo. O poeta romântivo volta-se para si próprio, quer deslgar-se da sociedade. Predomina nos poemas a 1ª pessoa:

"Minh’alma é como um deserto
Por onde romeiro incerto
Procura uma sombra em vão;
É como a ilha maldita Que sobre as vagas palpita
Queimada por um vulcão!
... (Fagundes Varela) {: cite=recuo.lpeu}

  • Nacionalismo (no Brasil, indianismo)
    Ao contrário do movimento árcade que deliciava-se com o pastoril, o romântico valoriza o local, seja ele qual for. O herói é perfeito moralmente: integridade de caráter:

"Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaúba;
Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros." ... (José de Alencar) {: cite=recuo.lpeu}

[…] É para mim uma das coisas mais admiráveis que tenho visto nesta terra, o caráter desse índio. Desde o primeiro dia que aqui entrou, salvando minha filha, a sua vida tem sido um só ato de abnegação e heroísmo. Crede-me, Álvaro, é um cavalheiro português no corpo de um selvagem!
...(O Guarani, de José de Alencar) {: cite=recuo.lpeu}

Em Portugal, os escritores enaltecem o herói medieval:

"O ruído abafado e bem distinto do mover dos dois exércitos vai-se gradualmente confundindo num som único, ao passo que o chão intermédio se embebe debaixo dos pés dos cavalos. Essa distância entre as duas muralhas de ferro estreita-se, estreita-se! É apenas uma faixa tortuosa lançada entre as duas nuvens de pó. Desapareceu!" ... (Eurico, o presbítero, de Alexandre Herculano) {: cite=recuo.lpeu}

  • Maniqueísmo
    Em contraposição ao herói, há o malfeitor: tema na maioria das narrativas românticas:

No romance O Guarani, de José de Alencar, o bem e o mal se confrontam. "Ceci" representa o lado bom e provoca sentiment os elevados e puros; "Isabel" é o demônio, representa a terra, provoca sensualidade. {: cite=recuo.lpeu}

  • Morbidez, pessimismo
    Esta é outra característica do romântico: associada ao lirismo e inocência, há o desejo de morte, a paixão da loucura, do final infeliz; influência do autor inglês, Lord Byron:

"Oh! Não maldigam o mancebo exausto
Que nas orgias gastou o peito insano,
Que foi ao lupanar pedir um leito
Onde a sede febril lhe adormecesse!
Se ele poeta nodoou seus lábios
É que fervia um coração de fogo"
... (Álvares de Azevedo) {: cite=recuo.lpeu}

  • A natureza
    A natureza segue o estado de espírito do romântico: nos momentos de alegria, tudo é luz e beleza; na tristeza, tudo fica fúnebre, há também a fase de ironia:

Teu romantismo bebo, ó minha lua,
A teus raios divinos me abandono,
Torno-me vaporoso... e só de ver-te
Eu sinto os lábios meus se abrir de sono.
... (Álvares de Azevedo) {: cite=recuo.lpeu}

  • Liberdade de expressão
    Há uma recusa a usar as regras do outro para expressar-se: o artista, o poeta quer ser original. Ao invés do racionalismo árcade, o romântico quer o sonho, a fantasia, a imaginação. Se o mundo não lhe traduz o que ele quer, ele inventa:

Ah! vem, pálida virgem, se tens pena
De quem morre por ti, e morre amando,
Dá vida em teu alento à minha vida,
Une nos lábios meus minh’alma à tua!
... (Álvares de Azevedo) {: cite=recuo.lpeu}

  • A visão da mulher
    Para o romântico, a mulher é idealizada: pureza e perfeição:

Ó, minha amante, minha doce virgem,
Eu não te profanei, e dormes pura:
No sono do mistério, qual na vida.
Podes sonhasr apenas na ventura." ... (Álvares de Azevedo) {: cite=recuo.lpeu}

"Moreninha, Moreninha
Tu és do campo a rainha
Tu és senhora de mim;
Tu matas todos d’amores
Faceira, vendendo flores
Que colhes do meu jardim." ...(Casimiro de Abreu) {: cite=recuo.lpeu}

  • Escapismo
    O romântico, para expressar suas mágoas, refugia-se em qualquer lugar: no sonho, na natureza, na morte, no passado (infância):

[..] Era uma noite - eu dormia
E nos meus sonhos revia
As ilusões que sonhei!
E no meu lado senti...
Meu Deus por que não morri?
Por que no sono acordei?
... (Álvares de Azevedo) {: cite=recuo.lpeu}

"Meu Deus! eu chorei tanto no exílio!
Tanta dor me cortou a voz sentida,
Que agora neste gozo de proscrito
Chora minh’alma e me sucumbe a vida!" ... (Casimiro de Abreu) {: cite=recuo.lpeu}

  • Fusão do grotesco e do sublime
    Nessa nova tendência há o encontro do grotesco e com o sublime - não há lugar para o que é belo:

“Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.”
... (Augusto dos Anjos) {: cite=recuo.lpeu}

  • Religiosidade
    Volta à religiosidade como forma de combate ao racionalismo do século anterior:

"Deus me livre de debater matéria tantas vezes disputadas, tantas vezes exaurida pelos que sabem a ciência do mundo e pelos que sabem a ciência do céu! Eu, por minha parte, fraco argumentador, só tenho pensado no celibato à luz do sentimento e sob a influência da impressão singular que desde verdes anos fez em mim a idéia da irremediável solidão da alma a que a igreja condenou os seus ministros, espécie de amputação espiritual, em que para o sacerdote morre a esperança de completar a sua existência na terra." ... (Eurico, o presbítero, de Alexandre Herculano) {: cite=recuo.lpeu}

Ver o próximo movimento literário Realismo/Naturalismo/Parnasianismo

Professora de Língua Portuguesa - Glória E. Galli - Formação - Letras na UNAERP e Mestrado em Linguística pela UFSCar
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